segunda-feira, março 30, 2009

Ainda o teatro - a verdade escondida

Todos os anos é convidada uma personalidade de importância mundial no Teatro para escrever a mensagem que será lida em todas as salas de espectáculo do mundo antes da peça dessa noite. Este ano coube a Augusto Boal a tarefa; actor, dramaturgo, encenador, criador do Teatro do Oprimido e fundador do Teatro A Barraca nos idos tempos do pós 25 de Abril. Aqui fica.

Todas as sociedades humanas são espetaculares no seu cotidiano, e produzem espetáculos em momentos especiais. São espetaculares como forma de organização social, e produzem espetáculos como este que vocês vieram ver.

Mesmo quando inconscientes, as relações humanas são estruturadas em forma teatral: o uso do espaço, a linguagem do corpo, a escolha das palavras e a modulação das vozes, o confronto de idéias e paixões, tudo que fazemos no palco fazemos sempre em nossas vidas: nós somos teatro!

Não só casamentos e funerais são espetáculos, mas também os rituais cotidianos que, por sua familiaridade, não nos chegam à consciência. Não só pompas, mas também o café da manhã e os bons-dias, tímidos namoros e grandes conflitos passionais, uma sessão do Senado ou uma reunião diplomática – tudo é teatro.

Uma das principais funções da nossa arte é tornar conscientes esses espetáculos da vida diária onde os atores são os próprios espectadores, o palco é a platéia e a platéia, palco. Somos todos artistas: fazendo teatro, aprendemos a ver aquilo que nos salta aos olhos, mas que somos incapazes de ver tão habituados estamos apenas a olhar. O que nos é familiar torna-se invisível: fazer teatro, ao contrário, ilumina o palco da nossa vida cotidiana.

Em Setembro do ano passado fomos surpreendidos por uma revelação teatral: nós, que pensávamos viver em um mundo seguro apesar das guerras, genocídios, hecatombes e torturas que aconteciam, sim, mas longe de nós em países distantes e selvagens, nós vivíamos seguros com nosso dinheiro guardado em um banco respeitável ou nas mãos de um honesto corretor da Bolsa - nós fomos informados de que esse dinheiro não existia, era virtual, feia ficção de alguns economistas que não eram ficção, nem eram seguros, nem respeitáveis. Tudo não passava de mau teatro com triste enredo, onde poucos ganhavam muito e muitos perdiam tudo. Políticos dos países ricos fecharam-se em reuniões secretas e de lá saíram com soluções mágicas. Nós, vítimas de suas decisões, continuamos espectadores sentados na última fila das galerias.

Vinte anos atrás, eu dirigi Fedra de Racine, no Rio de Janeiro. O cenário era pobre; no chão, peles de vaca; em volta, bambus. Antes de começar o espetáculo, eu dizia aos meus atores: - “Agora acabou a ficção que fazemos no dia-a-dia. Quando cruzarem esses bambus, lá no palco, nenhum de vocês tem o direito de mentir. Teatro é a Verdade Escondida”.

Vendo o mundo além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida.

Assistam ao espetáculo que vai começar; depois, em suas casas com seus amigos, façam suas peças vocês mesmos e vejam o que jamais puderam ver: aquilo que salta aos olhos. Teatro não pode ser apenas um evento - é forma de vida!

Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!

sexta-feira, março 27, 2009

Dar novos mundos ao mundo

Quando era miúda gostava que fizessem bolos para que eu pudesse rapar a tigela. Agora que sou grande faço-os eu, mas continuo a rapar na mesma. Costumo ficar suja desde a ponta do nariz até ao queixo, de orelha a orelha (passa-se o mesmo fenómeno quando como gelados, mousses ou pastéis de nata, um mistério que ainda não consegui solucionar). Hoje consegui conquistar um novo território até agora inexplorado. Até os cabelos ficaram impregnados de papa amarelada. Ah tigre.

Teatro

Desde 1961 que 27 de Março é o Dia Internacional do Teatro. Há muitas comemorações e botaduras de discurso, mas uma coisa importante e democrática é que todas as peças que vejam hoje são grátis. Escolham a que quiserem mas não deixem de ir. Há lá coisa mais mágica que ver um acontecimento que apenas se passa naquela noite, para aquelas pessoas. História(s), lugar(es), personagens, pessoas, gente. E nós ali a vermos o milagre do teatro. Eu vou.

segunda-feira, março 23, 2009

Barack Obama Superstar

Não via tantos aplausos num programa de televisão desde que o George Clooney entrou numa sala cheia de gajas, incluindo a apresentadora.





Nesta segunda parte ele (deveria escrever Ele?) diz uma coisa importantíssima: queremos que as nossas crianças desejem ser engenheiros ou cientistas, que inventem e construam coisas que farão deste país grande. Ser gestor ou financeiro para fazer muito dinheiro não é coisa em que nos interesse investir.



quinta-feira, março 19, 2009

A vida é bela

Chegar a casa e encontrar as compras do supermercado encomendadas online todas arrumadas no sítio certo, o frigorífico, congelador e cesta de frutas cheios, uma perna de borrego assada com batatas e hortaliça cozida, a casa limpa e a cheirar a lavado. Avé world wide web, avé empregadas domésticas, avé multibanco. O dinheiro não compra felicidade, mas manda vir.

quarta-feira, março 18, 2009

A guerra dos mundos


Na página 13 do Público de hoje: o título já assustava "Relatório revela epidemia de HIV e SIDA na capital dos Estados Unidos". A peça começa com "Três em cada dez habitantes com mais de 12 anos na cidade de Washington, Estados Unidos, estão infectados com o vírus do HIV ou sofrem de SIDA".



Neste momento creio que até o meu miocárdio parou e andou um bocadinho para trás, qual Button fisiológico. 3 em 10? 30% da população de Washington infectada? Game over, acabou-se, se isto está assim em DC imagina em Beja.



Ainda em hiperventilação consigo ler a caixinha de baixo que me garante afinal serem só 3%. Ufa. É grave claro, epidemia declara-se a partir de 1% incidência, mas chiça 30! É que estando o número escrito por extenso nem podem reclamar ter sido gralha de zero a menos. Acho que lhes vou pedir uma indemnização por danos morais. Quer dizer, se os lucros da Sonae cairam 71% se calhar não vou muito longe...

domingo, março 15, 2009

Quiz da D. Ester

Quem disse: "Portugal fez-se para os portugueses. Portugal é dos portugueses e é para eles que nós temos que trabalhar para criar as condições para que sejam atraídos pelo nosso país"

a) José Pinto Coelho, PNR
b) Paulo Portas, CDS/PP
c) Manuela Ferreira Leite, PSD
d) Francisco Silva, Antral


Resposta aqui

sexta-feira, março 13, 2009

Tem dias, mas ainda se conjuga no presente do indicativo

Resposta aos leitores que aqui vêm parar perguntando ao google como era a vida sexual de ester.

terça-feira, março 10, 2009

First we take Tehran

Passei a minha infância a ouvir noticiários sobre a guerra Irão-Iraque, terras estranhas e longínquas onde pareciam só se interessar por andar à batatada ad eterno para me atrasar a chegada dos programas realmente interessantes. Lembro-me de perguntar, desesperada entre duas garfadas de puré de batata, se os adultos achavam que algum dia aquela guerra ia acabar. Outras se seguiram. Mas nesta semana poderei ir saber o que andaram eles a fazer antes, durante e depois das 1.5 milhões de vidas perdidas durante os noticiários da RTP1.

domingo, março 08, 2009

Ser mulher

Nasci mulher numa tarde de inverno, surpresa para todos que nessa altura não havia ecografias para prever géneros in utero. Depois de passado o desconsolo aos meus pais, que tinham esperança de acertar pelo menos à segunda, aproveitaram para capitalizar o que tinham aprendido sobre dobrar fraldas de pano para raparigas e a reciclar o guarda roupa da mais velha.

Enquanto fui crescendo, aprendi que as diferenças entre nós e eles se baseavam nos apêndices entre as pernas e pouco mais. Não havia distinção entre brincadeiras nem autorizações especiais para rapazes, a igualdade morava lá em casa.

Na escola, as coisas eram um bocadinho diferentes. As raparigas juntavam-se em bandos para saltar ao elástico, à corda e outras actividades interessantes, os rapazes gostavam de correr com bolas, fossem de futebol ou berlindes. Havia apenas uma coisa que cativava todos; uns pneus enormes, deviam ser de camião ou tractor (pareciam-me gigantescos, provavelmente não o eram), eu gostava de me encaixar lá dentro e que me fizessem rolar pelo recreio fora até ser parada com o embate numa parede qualquer ou apenas pelo atrito da borracha no cimento. O frissom de não ver, de não controlar, de não saber quando ia parar, era indescritível.

Na sala de aula lembro-me que a professora da 3ª e 4ª classe adoptou uma técnica pedagógica que sempre me escapou ao entendimento. Dividia os alunos em grupos: os elevados, os bons, os médios, os medíocres e os maus. Eu era a única rapariga na mesa dos elevados, e várias vezes os apanhei em conspirações para me expulsarem da sua companhia para conseguirem ser os mestres do universo da sala da Sra. D. Eduarda. Houve uma semana em que desci as notas de propósito e passei para a mesa dos bons, que alívio. Era gente mais interessante e mais acolhedora. Infelizmente a professora percebeu a marosca e lá voltei para os elevados, a ter de levar com aqueles embriões de criaturas intragáveis que achavam giro terem clubes de bolinha e sentirem-se os maiores lá da esquina.

Em casa nunca percebi que havia coisas que mulheres ou homens não pudessem fazer. Tanto a minha mãe como o meu pai trabalhavam e muito, a empregada doméstica era a Manuela e o baby sitter era o Francisco. Já nessa altura a minha mãe não chegava a casa às 5h, os empregos eram até ao fim do dia, e havia quem tivesse de ficar connosco. Às vezes eram os avós, mas mesmo aí tanto eles como elas se empenhavam em estar com as miúdas.

Comecei a entender que as mulheres tinham mais deveres que direitos quando a minha mãe achou que já tínhamos idade para ouvir as suas queixas. Que tinha de trabalhar o dobro deles para provar o seu valor para além dos saltos altos, que os lugares de topo estavam cheios de gravatas, que votar era um direito recentemente adquirido, que tantas das coisas que eu dava como normais existiam graças a tantas pessoas antes de mim terem lutado por elas e tantas vezes terem pago preços demasiado altos. Percebi então que a mesa dos elevados era uma estranha representação do que era o mundo e que noutros tempos eu nunca poderia estar ali sentada. Nem poderia ir à escola, na verdade.

Eu tenho muita sorte. Pude estudar o que quis, escolher os trabalhos que mais me interessavam nos sítios que queria, nunca senti qualquer diferença ou condicionamento nem tratamento especial por ser mulher. Estou muito grata a todas os homens e mulheres que fizeram com que isto fosse possível.

No dia em que fiz 18 anos fui-me recensear à Junta de Freguesia com muito orgulho, vim de lá a contemplar o meu cartão de eleitor como um crente para uma pagela. Anos mais tarde vi um documentário sobre as primeiras eleições livres na África do Sul, depois da queda do apartheid. As filas para votar eram quilométricas, as pessoas vinham de todas as aldeias e dançavam e cantavam nas horas, dias, em que esperavam para poder finalmente serem pessoas e cidadãos por inteiro. E mulheres, muitas. Percebes, perguntou-me a minha mãe entre kleenexes. Claro que sim, respondi depois de me assoar.

quinta-feira, março 05, 2009

Quando for grande quero ser assim

Ou melhor, quero um par assim agora. Graças ao twitter (sim, já lá estou) e ao Sir Ken Robinson descobri este vídeo magnífico. Nota mental: nas próximas presidenciais apoiar o Manuel João Vieira, se se mantiver a promessa de um bailarino cubano para todas as mulheres e uma patinadora artística para todos os homens (há aquele detalhe de que só desiste se for eleito, mas não custa sonhar).
Com diz Sir Ken, Dance on!


segunda-feira, março 02, 2009

Um lugarzinho no céu

Estreia sexta feira


Fidélio, o Toxicodependente, Casimiro, o Jornalista, Mirov, o Ucraniano e Anunciada, empregada doméstica. O que é que os une naquela zona onde ninguém passa, onde ninguém vive?

FICHA TÉCNICA E ARTÍSTICA

Texto: Joaquim Paulo Nogueira

Encenação: Joaquim Paulo Nogueira, Joana Lobo (Assistente de encenação /Dinâmicas de corpo e voz)

Actores: Ana Gil, Filipe Luz, Miguel Santos, Rui Pereira e José Carlos Pontes (pianista)

Música original: José Carlos Pontes

Espaço Cénico e Figurinos: Isabel Alves Mendes

Espaço sonoro: Hugo Guerreiro

Graffitis: Marco Almeida

Iluminação: Marinel Matos

Sonoplastia: Dina Marques

Luminótecnia: Carlos Casimiro e Élio Luís

Cartaz/Programa: Tiago Alves Mendes /Magnésio

Direcção de Produção: Élio Luís

Retroversão do telefonema de Mirov: Valentina Naumyuk do Grupo RefugiActo

Fotografia: David Marçal e Daniel Lobo Antunes

Produção: AltaCena

Ideia original: Joaquim Paulo Nogueira, José Boavida e Pedro Alpiarça

Duração: 1h30

Classificação etária: M12

Apresentações:Março: 6,7,13,14,21,27,28 Abril: 2, 3 de às 21h30

Bilhete: sócios 5€ / não sócios 7,5€

Sociedade de Instrução Guilherme Cossoul

Av. D. Carlos I, 61 -1º LISBOA

INFORMAÇÕES E RESERVAS: TELF: 21 397 34 71

domingo, março 01, 2009

E agora eu sou

A sem-se-ver indicou-me para uma corrente engraçada, a das 6 verdades e 3 mentiras. Ainda considerei mudar a proporção de mentiras, é mais divertido brincar ao faz de conta que à verdade ou consequência. Mas como regras são para se cumprir, aqui vão:

1. Já fui loira, e descobri que isso tem de facto um efeito sobre os homens - e mulheres. Eles adoram mas não ouvem metade do que dizemos, elas odeiam e ouvem tudo para poderem dizer mal.

2. Gostei muito de me ver vestida de noiva, branco e tudo a que tinha direito. Excepto o suspiro pelas pernas abaixo, que é foleiro.

3. Estive em Vila Nueva del Fresno para comprar caramelos.

4. Já sofri de assédio sexual por uma vendedora de lingerie, que insistia em pôr-me as mãos nas maminhas para ver quão bem me assentava o tecido.

5. Não sei andar de bicicleta.

6. Gosto muito de cozinhar, especialmente pato em todas as suas variantes.

7. Uso saltos altos quase todos os dias.

8. Gosto de homens com narizes feios.

9. Tenho umas mãos horrorosas, o que não me impede de as arranjar com verniz às cores e tudo.