domingo, novembro 30, 2008

A aranha

Enquanto me deliciava com o jorro de água quente pela cabeça abaixo descobri uma inquilina no canto oposto do duche, encostada ao tecto. Ficámos a olhar-nos como num duelo numa rua empoeirada do Oeste, vi-a atenta e quieta e decidi que poderíamos partilhar a casa de banho desde que ela não me fosse aos cremes.
Os dias foram passando e a aranha ia engordando, aumentando o seu círculo castanho interno e as longilíneas patas cada vez mais peludas. Comecei a ver-lhe feições e a imaginar que crescia para um dia me engolir a mim também, numa digestão demorada e preparada há semanas.
Contei a uma amiga do novo bicho de estimação, que me protegia dos insectos e me mirava no banho, como uma grande irmã muda e queda. Voltou da casa de banho em choque, aquilo é uma tarântula mais peluda que eu em vésperas de ir ao salão, qualquer dia pica-te e deve ter veneno. Achei que tinha chegada a altura de expulsar a oito patas da minha intimidade.
Não a queria matar, para além do mau karma dizem que trazem dinheiro, em tempos de crise nada pode ser menosprezado. Com uma amiga audaz delineámos um plano: com a vassoura atirá-la para a banheira, com um lenço de papel pegar nela e atirar pela janela. Eu fico com a vassoura, mas aviso que vou gritar. Gritei, a aranha não. Expulsámo-la à intempérie.
Hoje senti a sua falta no banho.

sexta-feira, novembro 28, 2008

O amor em lugares estranhos

Eu morava no 6º esquerdo e tinha pouco mais de 18 anos, no 7º direito uma família com um míudo de 8 anos cuja janela dava para a varanda do meu quarto. Um dia aterrou-me um desenho infantil dobrado em aviãozinho, achei que tinha sido um acaso, mas como era giro guardei-o. Nos dias seguintes continuaram a chover desenhos feitos a lápis de cor em papel cavalinho A4 que eu recebia com prazer e acrescentava à colecção. Até que um dia apareceu mais uma dessas folhas, onde estava escrito a amarelo com uma caligrafia ainda a ganhar mão - "Amo-te! João Morais".

Quando encontrei o rapaz no elevador com o pai disse-lhe que tinha recebido os seus desenhos, agradeci-lhe sublinhando com um sorriso. Ele corou até à raiz dos cabelos sob a expressão espantada do pai, nem conseguiu responder. Fiquei com sentimento de culpa por lhe ter partido o coração com a insensibilidade da minha revelação pública. De vez em quando olhava para a varanda mas não voltaram a aparecer os recados.

quinta-feira, novembro 27, 2008

Do lugar onde estou já me fui embora















Carla Maciel, Fernando Mota, Luciano Amarelo e Miguel Seabra controem personagens apalhaçadas que (não) falam da velocidade da vida. Um lindíssimo espectáculo com o bom gosto de sempre do Teatro Meridional, uma "tolice em dó maior" que dá gosto ver - VLCD até dia 21 de Dezembro na Rua do Açúcar.

Perguntas que me desconcertam

Jovem, pode dar-me um minuto da sua eternidade?

Problema de expressão

Mandam-me uma fotografia minha de há 16 anos; na altura achava-me um gebo e agora vejo-me gira. Mais fotografias, de bikini com a família no verão de 2001. Olha, estava magra, sempre achei que não.

Daqui a 10 anos, quando olhar para mim como sou agora, ver-me-ei decerto magnífica. Pena esta coisa de me apreciar ao ralenti.

quarta-feira, novembro 26, 2008

Sem título

Pela janela aberta oiço uma voz de mulher chamar pelo cão

- Piloto, aqui!

e enternece-me.

Bicicletar por aí

Vivi durante alguns anos numa cidade não portuguesa onde me podia mexer para todo o lado em bicicleta. Desencantei uma pasteleira preta linda, velha a cair de podre que só travava bem na roda da frente (como nunca me espetei de dentes no asfalto é um milagre que atribuo a Santo António), enfiei-lhe um cestinho no guiador e andava feliz e contente. Servia-me para tudo, incluindo as compras do supermercado - com o meu método optimizado levava um saco em cada punho e o terceiro no cestinho, desde que não guinasse demasiado para os lados o plástico não se enfiava pelos raios da roda da frente (de novo, Sto. António sempre atento).


Para além da cidade ser plana, os traseuntes e automobilistas (não consigo dizer esta palavra sem pensar que devia constar uma fotografia do meu avô materno, de boné e luvas de pele sem pontas nos dedos, na respectiva entrada na enciclopédia ilustrada) estavam mais que habituados a partilhar a estrada e os passeios com os apêndices de duas rodas.


Das poucas vezes que tentei a façanha em Lisboa senti-me dentro de um episódio das corridas mais loucas, temendo pela própria vida dada a insensatez dos carros que acham que quem tem bicla que vá para o parque.


Há uns meses li um artigo na new scientist sobre os perigos a que os ciclistas citadinos estão sujeitos - e que nem o capacete os salva. Medindo as distâncias que os carros mantinham da sua bicicleta com e sem protector na cabeça, o investigador chegou à conclusão que lhe davam mais espaço para cair se vissem a sua mona desprotegida. A mais divertida experiência foi quando o mesmo homem na mesma bicicleta pôs uma cabeleira feminina, que fazia com que os condutores se afastassem dele como de criptonite vermelha. Gajas, já se sabe, são desajeitadas, deixa cá ver se não a passo a ferro. (o início do artigo está aqui, para mais informações subscrevam-na).


A questão da inclinação de Lisboa, habilmente explicada aqui, parece-me apenas acessória à do civismo na estrada e condições lojísticas para o uso da bicicleta. Não se pode levá-la nos transportes, no comboio apenas nos urbanos, regionais e interregionais, se e só se, autorizado pelo picas de serviço - o que não é de todo um estímulo para quem precise de usar os transportes públicos em conjunto com a bicla. Convenhamos que pedalar de Mem Martins até ao centro de Lisboa é façanha apenas ao alcance de Venceslaus que têm mais que fazer que ir trabalhar para o escritório a suar em bica e a cheirar mal.

Dizer que (ontem aprendi que é bem começar assim as frases, se quiser parecer uma pessoa séria) as pessoas que mais se inflamam com a questão da impossibilidade de usar bicicleta em Lisboa se incluem nos que não a usaria no seu quotidiano é capaz de não ser um tiro ao lado.

segunda-feira, novembro 24, 2008

Requisitos

Parece que já tenho data provável para a apresentação da minha tese de doutoramento. Aviso desde já que quero um microfone madonna, três toalhas brancas, sete garrafas de água do fastio e fruta fresca à discrição - manga, papaia e rambutão. Da minha comitiva pessoal seguirão o personal trainer de meditação transcendental, massagista especializada em fascioterapia, manicure, cabeleireiro e as d.esterettes para aplaudirem de pé a performance. Em breve apresentarei o esquiço da roupa desenhada para a ocasião, por um reputado estilista português.

De que é que trata a tese? Who cares?

domingo, novembro 23, 2008

Prazeres íntimos

Fazer um bolo de chocolate para me deliciar a rapar a bimby

(acabo sempre com uma mancha castanha na ponta do nariz)

sábado, novembro 22, 2008

Dra Ester and Mrs Hyde

Segui o link da Joana Lopes, impulsionada pelo seu resultado de Salteadora da Arca Perdida - um dos meus filmes preferidos de sempre. Há que escolher o número de perguntas a que nos queremos submeter para a precisão do diagnóstico, escolho 27 logo abaixo do número máximo 45. Ao aparecer a sina no ecran solto uma sonora gargalhada e partilho assim convosco que sou uma brava do pelotão


Descontente por descobrir que o Oliver Stone é o realizador que me caracteriza, atiro-me para o de líder mundial. O tom das risotas subiu consideravelmente: com que então as pessoas que não gostam de mim apanham com armas químicas? Bem, se entrarem na casa de banho depois de me aliviar é bem provável. Quanto a ser a mais duraça do quarteirão, dou de barato, vivo num bairro de velhotes que lutam pela integridade física e manutenção da independência à força de papo-secos e margarina. Não tenho medo do confronto? Vocês e mais quantos, heim?



A minha auto-imagem sofre assim um rude golpe. Eu que me considero uma pacifista, que me acho zen até à quinta casa, sou definida por senhores da guerra em todas as frentes. Vou ali alinhar os shakras e já volto.

quarta-feira, novembro 19, 2008

A kind of hush

There's a kind of hush all over the world tonight.
All over the world you can hear the sounds of lovers in love.
You know what I mean.
Just the two of us and nobody else in sight.
There's nobody else and I'm feeling good just holding you tight.

A minha mãe a guiar o carro, a pôr o rádio mais alto quando esta música começava e a cantá-la arrastando o sh da frase e batendo com as mãos no volante enquanto abanava o tronco. A partir de uma certa idade tinha vergonha que a minha mãe cantasse ou dançasse em público, como todos os adolescentes. Também não gostava que ela me desse a mão ou abraçasse quando passeávamos na rua, as pessoas iam achar que eu era uma criança. Depois passou-me.

So listen very carefully.
Closer now and you will see what I mean.
It isn't a dream.
The only sound that you will hear
Is when I whisper in your ear
I love you forever and ever.

A minha mãe era muito desafinada, daquelas que não consegue acertar com uma nota no sítio certo e que ouvida sem a música por trás fazia com que se percebesse apenas o que queria cantar pela letra. De vez em quando aborrecia-se com a troça que fazíamos e afirmava "tenho óptimo ouvido, não tenho é voz". O seu excelente ouvido fazia-a confudir o Bono com o Mark Knopfler, coisa pouca.

There's a kind of hush all over the world tonight.
All over the world you can hear the sounds of lovers in love.

Um dia descobrimos uma maneira de tornar os seus dotes canoros úteis. Quando voltávamos do campo era preciso dar banho aos gatos, actividade que eles detestavam e da qual fugiam como podiam. Em desespero de causa a minha mãe começou a cantar para os tranquilizar e teve como efeito o congelamento imediato de todos os seus músculos - os bichos ficavam agachados, de orelhas para trás e rabo no meio das patas com o comprimento de onda ímpar da sua voz, se tentava uma nota mais aguda quase colavam a barriga ao alguidar. O banho dos gatos tornou-se num espectáculo familiar hilariante, e um regozijo para a autora da minha existência que via finalmente aplaudidas (ainda que de forma peculiar) as suas características vocais.

So listen very carefully.
Closer now and you will see what I mean.
It isn't a dream.
The only sound that you will hear
Is when I whisper in your ear
I love you forever and ever

Hoje vinha a guiar e deu esta música na rádio e estas memórias saltaram todas. Comecei a cantar e a sorrir. Enquanto houver quem se lembre de nós estamos vivos.

There's a kind of hush all over the world tonight.
All over the world people just like us are fallin' in love.
Yeah, they're fallin' in love.
Hush, they're fallin' in love.
Hush.

terça-feira, novembro 18, 2008

Informações: senha verde

Detesto defraudar os leitores. E no entanto, o google continua a fazê-lo por mim, facto pelo qual peço desde já humildemente desculpas. Aconselho a que quem quer saber coisas tão específicas como o que vai ainda acontecer no mundo passem a usar aspas para serem devidamente encaminhados para o consultório do Paulo Cardoso, visto que a Maya agora anda ocupada com programas interessantíssimos das tardes da televisão e não deve ter vagar para respostas tão complicadas. Também para aqueles que querem ver filme porno comendo a vizinha talvez seja mais útil passarem pelo redtube ou portal semelhante. Não é que tenha nada contra pornografia, mas ao meu lado mora uma velhinha de 80 anos, por baixo uma respeitável família com o apelido na porta, e do outro uma megera de verruga no queixo, não estou na disposição de me deixar comer por nenhum deles e ainda menos filmar para pôr aqui.

No entanto, não posso deixar de sentir uma pontada de vaidade ao descobrir que sou a 9ª entrada em 275.719 por erotismo em blogs. Ora toma.

segunda-feira, novembro 17, 2008

Estatisticamente significativo

Uma casa no meio do nenhures, falha a electricidade e a nada o disjuntor se moveu. Enquanto o resto da família tacteava o escuro à procura de velas o patriarca saiu à rua para averiguar a causa da coisa. Como na única construção visível da estrada também não havia rasto de luz, apressou-se a regressar apaziguado com a sua conclusão, definitiva e peremptória - é nacional.

sexta-feira, novembro 14, 2008

Pontos de vista

Depois de ter descoberto numa ida ao pavilhão do conhecimento que sou um homem por dentro, vêm agora uns analistas da blogosfera repôr a verdade dos factos, a que tive acesso graças à Joana Lopes. Dado que falo sobre o meu ponto de vista (ainda não sou suficientemente esquizofrénica para me desdobrar em heterónimos que não os nominais) e não tenho tempo nem paciência para actualizar diariamente o blog (parece que os homens, por decerto ausência de actividades domésticas, o fazem), sou indubitavelmente do sexo feminino. Andava há mais de um ano inquieta com a minha fisionomia que contrariava a prova científica, agora posso estar tranquila com a existência de ovários que me tornam escrava não apenas das hormonas como dos meus pontos de vista.


Querem intervenção, cidadania, debate e troca de conhecimentos? Vão bater a outra porta, aqui vive uma gaja. Que fala de si, dos outros, dos conhecidos e desconhecidos, de moscas, empreendorismos, ordenamento do território, da condição social, mas sempre sem conversar com outros, sem pensar e sobretudo sem intervir, Deus me livre. É que para intervir há que tê-los e no sítio, e pelos vistos ler muitos jornais para ter opinião. Eu leio a newsletter do portal do cidadão e é um pau.



Uso saltos altos, cabelo comprido, unhas arranjadas, pinto os olhos, posso lá eu ter tempo entre a depiladora e umas receitas de bacalha à brás, nos dias em que não vou ao salão erótico, para escrever sobre coisas sérias. E sobre temas que façam pensar.



Hoje houve alguém que aqui veio dar procurado no google por respostas curtas parvas e idiotas. Nunca este blog foi tão bem definido.




quarta-feira, novembro 12, 2008

O primeiro baile da D. Ester

Tínhamos 11 anos e andávamos na mesma escola preparatória. Ele chamava-se Tiago e tinha uns olhos lindos, escuros e de pestanas pretas longas. Não éramos da mesma turma, mas com tanta sorte uma das minhas amigas já da primária era sua vizinha de prédio e assim fomos apresentados no recreio. A intermediária garantia-me que ele gostava de mim, devia fazer o mesmo com o rapaz, o que nos deixava embaraçados sempre que estávamos juntos. Um dia deixei-me estar sentada ao seu lado no muro depois dos outros terem ido brincar, nenhum de nós conseguia falar muito e ele ia raspando a pele da mão esquerda com um pauzinho. Pedi-lhe para ver o que tinha feito, ele não queria o que apenas aguçou a minha curiosidade. Insisti, puxei-lhe o braço, e de repente tinha a sua mão na minha e vi o meu nome cravado na pele dentro de um coração. Corámos ambos, encolhemos os ombros, e fomos a sorrir para casa.

A minha amiga fez anos e fomos ambos à festa. Pusémo-nos a ouvir música no gira discos, os singles e os LP. Começaram os slows, e eu sentada na cama morta de vontade de ser pedida para dançar. Com o Up where we belong ele ganhou coragem - levantou-se e estendeu-me a mão. Entre os risinhos dos outros levantei-me, pus-lhe as mãos nos ombros, as dele na minha cintura e embalámo-nos ao som da rouquidão do Joe Cocker. Com o andar das estrofes fomo-nos aproximando devagarinho, timidamente. Ele apertava os braços à minha volta e eu os meus no seu pescoço, encostámos finalmente as caras e deixamo-nos a disfrutar o momento, a primeira dança a dois. Nem démos pela música acabar, puseram logo outra e nós ali continuámos, abraçados pela primeira vez sem vergonha para quem nos quisesse ver, até que mais ninguém repôs música e reparámos que se tinham cansado todos menos nós. Acordámos do nosso estupor, desembaraçámo-nos dos corpos um do outro e pouco tempo depois despedimo-nos.

No ano seguinte mudei de bairro e nunca mais o voltei a ver. Sempre que oiço a música lembro-me desse amor inocente, vivido por inteiro nessa dança.

segunda-feira, novembro 10, 2008

Ídolos - infância

O primeiro homem desconhecido que adorei era gordo, tinha barbas e óculos e idade para ser meu pai. Edipiana me confesso, mas não foi pela aparência que ele me conquistou, entranhou-me pelos ouvidos.

As letras que ele imaginava e as música que compunha para as acompanhar faziam-me ficar em silêncio durante horas, e ouvi-las vezes sem conta. Tinha a certeza (ainda tenho, no fundo) que algumas foram escritas só para mim, que mas dedicava num segredo que era nosso e que guardava à vista de todos.

Para além dos LP e dos singles, obriguei o meu pai a repetir um espectáculo teatral ad nausea para ouvir as suas palavras.

A minha maior alegria ao ter-me licenciado não foi ter acabado essa parte do percurso de vida, ou começar finalmente a ser paga pelo que fazia. Foi ter a sua assinatura no meu diploma, fiquei durante horas a contemplá-lo numa alegria infantil e interior.

Das vezes em que me cruzei com ele na vida real fui sempre incapaz de proferir uma palavra, ficando em muda e queda admiração da criatura como quando vi pela primeira vez o David Bowie ou o Prince ou o Sting... que digo? Mais, muito mais.

Não há amor como o primeiro. Lembro-me do natal em que recebi o LP do macaco zacarias, aos pulos e gritos na cama dos meus pais, "vejam vejam, o que o pai natal me trouxe! Como é que ele soube que era mesmo isto que eu queria?"
















O meu primeiro amor foi o José Barata Moura

Este não é um post de parabéns



Bacalhau à Brás (4 pessoas)

Ingredientes:
750 g de bacalhau demolhado (duas ou três postas)
750 g de batatas - ou 1 pacote grande de batata palha
1/2 kg de cebolas (duas médias grandes)
3 1/2 dl de azeite (a olho)
1 alho (um dente ou dois)
6 ovos (para aí)
salsa picada, sal e pimenta q.b.

Receita:

Escalda o bacalhau, (põe-no no escorredor e faz passar água quente), tira-lhe as peles e espinhas e desfia.

Pica as cebolas e o alho, aloura em azeite quente no tacho metalizado (até ficarem com ar opaco e mole).

Junta o bacalhau, dzzzz dzzz, até achares que está (quando fica com ar meio cozinhado mas sem estar espapassado, mexe, põe a tampa e deixa ficar um bocado).

Atira as batatas palha, zuca zuca, mexe mexe, até ficarem moles e uma coisa homogénea (deixa ficar um bocado, com a tampa também).

Bate os ovos na taça redonda nº 2, junta pimenta e um nadinha de sal (não te esqueças de provar o bacalhau, para ver como ficou demolhado).

Quando já tiveres os convidados todos em casa podes atirar os ovos para a mistura preparada, mexe mexe sem deixar secar mas até aos ovos estarem agarradinhos ao resto da matéria prima.

Põe numa travessa e enfeita com as azeitonas e a salsa que já deixaste picada na tábua azul.

sábado, novembro 08, 2008

Snobeira

Comer atum de lata com garfo de peixe

sexta-feira, novembro 07, 2008

Ainda o purgatório

Não sei o que significa entregar a vontade e a vida a uma entidade que não se vê. Sei que passamos os primeiros anos sob os desígnios dos pais, contra os quais nos rebelamos na adolescência e com quem, com sorte e maturidade, fazemos as pazes na vida adulta e podemos finalmente viver a relação em pleno.

Quando a personalidade se constrói em alicerces virtuais, em fachadas para não mostrar fraquezas, quando se tem medo de mostrar o lado frágil, vulnerável, magoável, come as possibilidades de humildade e gratidão necessários ao amor incondicional.

Depois de partir tudo à volta, tudo mesmo, esperar sair renovado mas que nos levem ao colo sem que tenhamos de pedir - sem perceber que os braços são de fraco músculo para tanto peso - vem a ansiedade, a insatisfação, o síndrome calimero a quem todo o mundo deve mas não parecem saber como dar.

Estou aflita, tenho medo, vejo padrões repetidos e que queria ver desaparecidos.

Não quero que voltes a ser aquele que eras, quero nunca mais ver o que foste. Quero-te agora como realmente és, com as qualidades que já conheço mas também com os defeitos e fraquezas que andaste habilmente a esconder durante tanto tempo. Uma pessoa inteira.

O problema da adicção não são as drogas ou o álcool, são os mecanismos que levam a pensar que se é melhor com uma consciência que não é a sua. Triste logro. Por muito mau que se possa ver ao espelho da alma, a realidade é sempre melhor que a ficção.


Salve, Rainha, mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve!

Procura-se

No programa de um fórum sobre empreendorismo, está previsto entre dois painéis a palestra:

Onde encontrar algum optimismo na actual conjuntura? - personalidade a designar

quinta-feira, novembro 06, 2008

Conversa de rua

- De cada vez que passo por cima de uma tampa de esgoto, como esta, penso sempre - será hoje? Tu não?

- A partir de hoje, sim.

quarta-feira, novembro 05, 2008

Dedicada ao outro lado do Atlântico

Sim, ele conseguiu. Depois do pesadelo de há 8 anos atrás, a mudança radical chegou aos EUA. Para todos os que acreditam que um mundo melhor é possível, começando com as suas duas mãos.


Um homem que afirma "I will listen to you, especially when we disagree", tem toda a minha atenção. Para ele e todos os que acreditam e lutam para que as coisas sejam diferentes, Ben Harper (filho de um mestiço preto/cherokee e de uma branca judia) parece-me o mais apropriado.


terça-feira, novembro 04, 2008

Saudades do verão

Com o início do frio e do acender dos aquecedores, chegam-me saudades do Verão. Férias quentes, o areal só para nós, o mar que cuspia ondas mansas, a serra mesmo ali ao lado, o cheiro da terra que se nos emprenhava no caminho para casa, o fim da tarde no alpendre e os duches ao ar livre.

Saudades de mim em ti.


segunda-feira, novembro 03, 2008

Erotismo em Lisboa


Salão erótico, FIL, Lisboa, domingo à tarde. A entrada era cara, com desconto para estudantes e reformados. A maior parte dos que por lá andava não era nenhuma das duas coisas.

Música muito alta, vinda dos inúmeros palcos de bares de strip a quererem chamar a clientela para os atributos e habilidades das suas meninas, alguns com homens hipermusculados com protuberâncias mais pequenas que as das esculturas gregas atrás das tangas apertadas, com convenientes aberturas fáceis laterais.

As mulheres que vão ao salão arranjam-se mais do que nos outros dias, botas de cano alto especiais, saltos altos, roupa de festa. Como se quisessem assegurar-se que os homens que as levam pelo braço não olharão mais para as desnudas beldades que para elas. Eles não perderam muito tempo com a vestimenta própria.

Delegações de sex shops que ofereciam quase todas o mesmo, com anunciados descontos a tentar escoar os produtos que as pessoas viam sem tocar, com olhares gulosos e dedos tímidos. Televisões com filmes porno, ao lado dos escaparates onde estavam à disposição por poucos euros, surpreendiam-me até a mim, com pilas ampliadas a meio metro a entrarem em vaginas depiladas, as caras das raparigas em esgares de esforço, como maratonistas cansadas a dez quilómetros da meta.

Como não conseguiam controlar os fotógrafos furtivos, era permitido registar o que quer que fosse. Cada vez que havia um show mais ousado parecia que estávamos numa conferência de imprensa de um estadista importante, com dezenas de objectivas apontadas e flashes incessantes. As trabalhadoras do sexo sorriam para a câmara, abraçadas aos visitantes que se queria imortalizar ao seu lado na película virtual. Afastavam-se como sorrisos triunfantes a verificar no ecranzinho da máquina se o decote tinha ficado bem centrado.

Numa loja elegante e bem arranjada, onde os brinquedos sexuais eram tão bonitos que poderiam facilmente passar por objectos decorativos em qualquer centro de mesa, interessei-me por um espartilho de brocado verde. Fiz perguntas aos donos da loja, experimentei, aconselhei-me, conversei como em qualquer outro sítio. Ficaram tão surpreendidos com a minha tranquilidade que se ofereceram para me descontar metade do preço, conquistando a minha felicidade em várias frentes.





Fiquei contente por ver uma barraca que se dedicava à educação sexual, distribuindo preservativos a quem passasse.

Cruzei-me com pessoas conhecidas, que ficavam entre o embaraço do encontro e a curiosidade com o meu saco de compras, mas sem coragem para perguntar sobre o seu conteúdo. Apressavam-se a ridicularizar cenas ou objectos que tinham visto, com risos nervosos e a afungentar qualquer ideia com que eu pudesse ficar sobre a sua intimidade. Vamos já embora, garantiam-me. Eu continuava divertida a ver as roupas interiores e a perguntar sobre o uso de formas inidentificáveis à vista desarmada, a empregadas solícitas e disponíveis. Oferecemos 30% de desconto e uma bússola, atiravam em jeito de oferta irrecusável.


Achei curioso que apenas no espaço de bdsm se vendessem quadros (horripilantes, mas para o caso não interessa), livros sobre sexualidade, e informação sobre o que é são, seguro e consensual. Como se só quem gostasse de andar na corda bamba íntima se preocupasse com os porquês e como das coisas.