sexta-feira, outubro 31, 2008

O cúmulo do disparate

Por engano enviar um mail para mim mesma, e clicar sim para o recibo de leitura.

O estado a que chegaram

"Há diversas modalidades de Estado: os estados socialistas, os estados corporativos e o estado a que isto chegou! Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos. De maneira que quem quiser, vem comigo para Lisboa e acabamos com isto. Quem é voluntário sai e forma. Quem não quiser vir não é obrigado e fica aqui" disse o capitão Salgueiro Maia para animar as hostes da Escola Prática de Cavalaria em Santarém, na famosa madrugada de 74.

Este é o estado a que chegaram os Estados Unidos da América. E usando das novas tecnologias, em vez de uma revolução propoem o acto cívico de exercer o direito ao voto. Pronto, é tendencioso. O voto é secreto, mas pensem nas pobres moscas.


quarta-feira, outubro 29, 2008

Vai buscar quem mora longe, sonho meu

Há meses tive um sonho perturbante, e de todas as vezes que me lembro dele entre risos do ridículo fico muito preocupada com o meu inconsciente.

Estava algures num bar entre a praia e a serra, imagino que na Arrábida. De repente aparece-me o Daniel Oliveira (que eu nunca vi mais gordo, a não ser de dedo em riste nos debates do prós e contras a defender o sim ao referendo sobre o aborto). O pobre senhor no meu sonho encantava-se por mim e não me largava dizendo que tínhamos de ter filhos juntos, "D. Ester já pensaste bem, os meus genes e os teus são uma combinação perfeita!" E apartir daí todo ele era mãos de polvo e olhares gulosos, e eu de repente sem vontade nenhuma de maternidade com tão insólita proposta.

Depois havia um anfiteatro, aulas na Universidade, uma ameaça de bomba atómica, uma crise mundial, e o Daniel Oliveira sempre ali. Não sei se ele era dos bons ou dos maus, mas se continuava a querer dar descendência ao mundo com os seus espermatozóides fundidos nos meus óvulos ou tinha uma agenda escondidada de nova arca de noé ou devia ser uma espécie de Jack Bauer omnipresente.

domingo, outubro 26, 2008

Pai, afasta de mim essa mosca

Mata-moscas, Philip Starck


Há muitos comentários inflamados sobre as declarações da Sarah Palin sobre o dinheiro mal gasto pelo governo, em coisas tão parvas como a mosca do vinagre, sublinhando as palavras fruit fly com sarcasmo - com a maralha por trás a rir-se do assunto com ela, e a dar-lhe o mote para continuar a chalaça com "não estou a brincar, há mesmo gente que trabalha com moscas da fruta!"



Eu ouvi as declarações sem saber o que me esperava, e o que me arrancou foi uma sonora gargalhada. Há muito tempo que não ouvia uma piada tão bem esgalhada, melhor que os gato fedorento com a rábula do fico chateado, pois claro que fico chateado. Desconfio é não ter sido pelos mesmos motivos que a assistência da Sra. Palin. É que com tanta investigação risível que se faz nos EUA e no mundo, foi logo buscar o pior exemplo de todos, dado que a Drosophila melanogaster a que ela se refere com tanto desprezo é dos bichos mais precisoso para a humanidade e para o conhecimento que temos tanto de genes, cromossomas, células, diferenciação celular... os exemplos são de tal forma tantos que nem vale a pena elencar todos. (para informação mais detalhada, a Palmira Silva explica e conta as reacções de várias pessoas 1, 2, 3)


No entanto, não sei se hei de rir dela ou dos seus assessores. É que alguém lhe plantou esta brilhante ideia na cabeça, e não creio que a senhora tenha chegado sozinha à Drosophila. Já agora o C. elegans, que é uma minhoca nojenta, ou as E. coli que dão diarreias aos incautos, ou, porque não, o macaco Rhesus. E as cobaias? Não, vamos bater nos murganhos, toda a gente sabe que os ratos passam doenças terríveis, quem é que no seu perfeito juízo tem ratos no laboratório? Nada disto, vamos governar a investigação científica como misses universo, não interessa para nada compreender os processos, evitá-los ou tratá-los, vamos dar de comer aos pobres e cuidar dos miúdos. Grande é a poesia, a bondade e as danças, mas o melhor do mundo são as crianças.

sexta-feira, outubro 24, 2008

Alzheimer

Ao almoço ocorreu-me um texto curto e bem humorado para o blog. Quando cheguei ao computador não me lembrava sequer sobre o que era.

E agora, o que havemos de fazer?

quarta-feira, outubro 22, 2008

Sobe que sobe, sobe a calçada

Antes das oito da manhã o portão da escola já tem mães com os filhos pequenos à espera que o venham abrir. São mulheres que têm de entrar cedo ao trabalho e precisam de ter onde os deixar. Têm todos caras ensonadas, os pequenos e as grandes; não há homens entre elas, apenas o ar cansado de quem repete todos os dias o mesmo ritual. Deixam os filhos na escola pública, vão a correr para casa das senhoras que têm de arranjar o cabelo e o talleur e lhes confiam os bebés, que elas não podem criar porque têm de ir para a empresa. Uma cadeia autofágica, ainda não percebi quem ganha mais.

Uma amiga minha tem uma pme de duas empregadas e motorista, será que alguma vez reparou nas caras delas de manhã, nas caras dos seus filhos que ficam mais horas que os outros à espera delas no páteo?

Numa conferência sobre o Ensino Superior fiquei a saber que quem chumbou alguma vez no secundário tem nulas hipóteses de entrar no superior; que os filhos das classes médias são 7 para 1 dos do proletariado nas faculdades, e prevê-se que esse número suba para 12:1 nos próximos 10 anos.

Para onde sobe Luísa?

segunda-feira, outubro 20, 2008

You can tell by the way I (don't) use my walk

Leio aqui que fizeram um estudo sobre a influência dos beats per minute da música na manobra de resuscitação cardio-respiratória, tendo chegado à brilhante conclusão a publicar em breve, que o Stayn' Alive dos Bee Gees é a que melhor se adequa para ajudar a salvar vidas de forma mais eficiente. Para além de ser um fortíssimo candidato aos Ignóbeis do próximo ano, temo a forma que usaram para chegar a essa conclusão. Olha, com este usámos o vou levar-te comigo do Duo Ouro Negro e o gajo quinou, se calhar é melhor uma coisa mais a abrir. O Waterloo também não serve, este teve uma síncope e começou a espumar da boca a dizer Mamma mia outra vez não.

Dizem que é da batida, mas a mim cheira-me que é da letra. Se um dia me encontrar estendida no chão entre cá e lá, e sentir um latagão a enfiar-me as mãos pelas costelas abaixo da mama esquerda adentro, enquanto repete

Whether you're a brother or whether you're a mother,
you're stayin' alive, stayin' alive.
Feel the city breakin' and everybody shakin',
and we're stayin' alive, stayin' alive.
Ah, ha, ha, ha, stayin' alive, stayin' alive.
Ah, ha, ha, ha, stayin' alive.

Sou capaz de pensar, porra estou a patinar. É melhor fazer qualquer coisa. E começo então

Life goin' nowhere. Somebody help me.
Somebody help me, yeah.
Life goin' nowhere. Somebody help me.
Somebody help me yeah. Stayin' alive.

domingo, outubro 19, 2008

And the winner is

A Joana Lopes atribuiu-me um prémio. Pronto, não foi um inventado mesmo só para mim, é das cadeias. Mas ainda assim, premium est. Como a Joana Lopes é uma blogger que muito prezo merece uma resposta pensada. Além do mais levo anos disto, primeiro com cartas a sério que se tinham de fotocopiar e enviar, e depois com mails que havia que forwardar sob pena de ficar sem uma perna, com sarna, ezerpela, mau olhado ou qualquer outra mazela que me atingisse a fisiologia ou a vitalidade, vou aceitar - não sem antes proferir o respectivo discurso e agradecimentos.

Pode ler-se nos princípios fundadores do Prémio Dardos (cuja origem não consigo encontrar em lado nenhum, mas deve ter sido inventado por alguém que tinha algumas dificuldades com a língua portuguesa) que o mesmo se destina a "reconhecer os valores que cada blogueiro mostra a cada dia, o seu empenho por transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc. em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras". Confuso? Sim, eu também fiquei um pouco. Mas lá que é elogioso é.

Assim, de dardos nas mãos e lágrimas nos olhos, quero começar por agradecer à minha mãe e ao meu pai, que numa encalorada tarde angolana de Março me conceberam, e desde Dezembro desse mesmo ano me começaram a criar. Agradeço-lhes não me terem assassinado durante as sessões nocturnas de choro convulsivo com que lhes presenteei os primeiros sete anos da minha existência, derivado às otites crónicas e constantes que me entravam pelo ouvido médio adentro. Se bem que se vingaram longamente, com consecutivas administrações de supositórios de paracetamol e obrigando-me a usar passe montagne mesmo no pino do verão, o facto de não me terem enfiado num cesto e ala rio abaixo significa quão seguros estavam que eu tinha sido cá posta com um propósito maior que eu ou eles.

Não agradeço à minha irmã mais velha, por não ter destruído as suas roupas enquanto crescia - eu apenas tinha direito a roupa nova nos anos e no natal, porque a dela ainda estava óptima para ser usada. Por causa disso tornei-me uma consumista compulsiva, enchendo o armário de mais e mais coisas novinhas em folha só para mim enquanto ela se refinou numa desprendida galopante, sendo capaz de se desfazer sem qualquer tipo de esforço ou dó de alma das coisas que já não precisa, não servem e não quer. O meu estatuto de herdeira em vida obrigou-me também a dar novo uso ao que velho era, o que sem dúvida foi o meu balão se ensaio para o desenvolvimento da minha criatividade, que agora se vê reconhecida através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre as minhas letras e as minhas palavras. Assim sendo e reconsiderando, agradeço então à primogénita dos meus pais, também lhe devo a ela o reconhecimento que ora vejo enfim espelhado neste prémio.

A todas as pessoas com quem me cruzei na vida, amigos e inimigos da mesma forma, por me darem a matéria prima de que este blog é feito.

A todos os livros que li, quadros que vi, música que ouvi, e que como tenho péssima memória e me lembro de tudo, vêm cá dar com os costados, quer queira quer não queira.

Agradeço ao Bill Gates, por ter criado o windows e ao Tim Berners-Lee pela World Wide Web, sem os quais os valores culturais, éticos, literários e pessoais pelos quais me rejo ficariam ao alcance apenas de uns quantos iluminados e não disponíveis aos que navegam por estes mares etéreos.

Por último, e fazendo jus ao passa ao outro e não ao mesmo, lanço os dardos que me foram confiados às minhas múltiplas do 8 e coisa para que os possam atirar para outra freguesia se assim o entenderem. Foi com elas que me iniciei no maravilhoso mundo novo das comunidades virtuais, e é de completa justiça que vejam devolvido o reconhecimento de uma das suas criaturas fundadoras, que apesar de andar nas termas a solo irá por lá dar umas perninhas quando se justifique. Minhas senhoras chofer a dançar com a criada, dizia ela baixinho, na prise és bestial, sete e picos, nove e tal, rebentou-lhe o suspensório, perante o riso geral, a d. inês sequiosa, a coluna vertebral, foi dançar a bossa nova e gerou-se a confusão natural, o palco é vosso.


ADENDA: No calor do momento, e embargada pela emoção, não nomeei algumas pessoas fundamentais em todo o percurso de vida que me fez chegar aqui. Depois de devidamente insultada com palavrões que aqui não posso repetir, sob pena de perder a coroa, venho repôr a verdade dos factos.

Agradeço também à minha irmã mais nova, adorável criatura que entrou pela minha vida adentro passava eu pouco dos 9 anos, roubando-me o estatuto de filhinha mais pequena do seu pai. Os insultos interiores foram tantos que a fizeram crescer mais 15 centímetros que eu, devolvendo-me a primazia que afinal continua minha, facto que penhorada lhe agradeço.

sábado, outubro 18, 2008

Casos da vida real


Há uns meses, com a família dos 8 aos 88 sentada à volta da mesa de jantar, uma prima mencionou que tinha visto um mini kit sadomaso numa vulgar loja de presentes de um centro comercial, decerto inspirados pelo sucesso nacional do call girl. Um dos miúdos ouviu atentamente a descrição e perguntou interessado se incluia um capuz, daqueles com fecho éclair na boca. Depois de um silêncio espantado alguém lhe perguntou onde é que ele tinha ido buscar essa ideia. "Duh, à internet", respondeu tranquilamente.

Felizmente estava um médico na sala para proceder à reanimação cardio-respiratória da mãe do pré-adolescente de 12 anos, enquanto a avó surda perguntava esganiçada e de dedo atrás da orelha o que é que ele tinha dito.

sexta-feira, outubro 17, 2008

Educação sexual

Um amigo meu andava num colégio católico de rapazes onde se tinham de confessar à sexta feira, para estarem puros para a comunhão de domingo. Apartir da puberdade o seu pecado recorrente era "cometi actos impuros sozinho", e todas as semanas desejava poder admitir ao padre que os tinha feito acompanhado. Eventualmente Deus ou o destino, neste caso a Maria do 5º esquerdo, concederam-lhe essa graça.

Defender a abstinência entre adolescentes é tão produtivo como tentar encontrar uma relação estatisticamente significativa entre o tempo do atraso dos comboios no Entroncamento e os cartões amarelos sofridos pelo Benfica ao domingo na Luz. Os miúdos são pessoas por inteiro, com desejos e capacidade crítica para saber discernir quando e com quem o quê. Considerá-los inimputáveis e decidir por eles a sua vida não os transforma em adultos saudáveis e capazes de escolher o próprio caminho. Para além de que a adolescência é, por definição, a época da emancipação e do confronto, e insistir num ponto apenas aguça a curiosidade e o engenho para contornar os obstáculos.

Quem se coibir de iniciar explorações sexuais por medo de represálias divinas ou raspanete dos pais, apenas se está a habilitar a uma vida íntima cheia de fantasmas, tabus e falta de prazer dos quais vão passar o resto da vida a tentar livrar-se. Ou não, e aí destilam fel contra tudo e todos que escolhem estradas diferentes das suas.

(impunha-se, depois destas conversas todas - 1, 2, 3 e 4)

Sinapses

A propósito deste post, John Cleese, papagaios e diálogos com pessoas de apelido Palin, um clássico.

quarta-feira, outubro 15, 2008

Pertinente

- Andar a criar excêntricos é uma coisa boa?

perguntou-me o meu sobrinho de 8 anos, ao ler o anúncio do euromilhões.

terça-feira, outubro 14, 2008

Saudade

Ontem teria feito 62 anos. Nunca gostou de aniversários, por isso fizémos um jantar com todos os seus amigos e não pusémos velas no bolo.

Na sala onde tenho os seus quadros na parede, abri a mesa de jantar, pus a toalha castanha e os guardanapos de pano, o serviço de porcelana e o faqueiro da vossa lista de casamento. Já não temos copos de cristal, mas usei os de pé alto que a Mãe gosta. Comprámos bacalhau espiritual daquela loja onde a comida era sempre boa, as suas amigas trouxeram vinho e sobremesa. Conversámos a noite toda sobre si Mãe. Dizem que encontram em mim tantas coisas suas, mesmo algumas que eu não gosto muito. A Mãe esteve sempre ali connosco. Sabe, às vezes faz-me muita falta.

Depois da Mãe morrer eu fui dormir para a sua cama e passei a ocupar o seu lugar na mesa. Senti-lhe o cheiro na almofada durante muito tempo, e era bom. A gaveta das suas camisolas de lã teve o seu perfume durante imenso tempo, abríamos e ficávamos a cheirar para a ter ali outra vez, só por um bocadinho.

Houve uma noite em que eu estava deitada na cama a chorar e senti as suas mãos em cima das minhas, aquelas mãos cheias de anéis e sempre secas, ideais para fazer queijo costumava dizer. Lembra-se? Eu acho que a Mãe esteve ali comigo nessa noite. Esteve, não esteve?

De vez em quando ia na rua e parecia que a via, alguém com o seu cabelo e o seu andar. Mas depois não era. Agora encontro-a no espelho quando me pinto.

Acontece-me sonhar consigo, a Mãe morreu mas não sabe e eu e a mana passamos o tempo todo a esconder-lhe isso para não lhe dar um desgosto, e normalmente conseguimos. Para onde é que a Mãe vai quando não está à noite comigo?

segunda-feira, outubro 13, 2008

Nem sinais de negro nem vestígios de ódio

Tenho um armário de 3,5 metros de largura cheio de coisas. Camisolas de meia estação e inverno, t-shirts arrumadas em molhos das de alcinhas, alças, manga curta e manga comprida, camisas, casacos e casaquinhos de malha, saias curtas, compridas e médias, calças de verão, inverno e todo o terreno, sandálias separadas pelas rasas e de salto, sapatos, ténis, botas curtas e de cano alto, carteiras de todos os dias e de festa, casacões de todos os tamanhos, formas, feitios e texturas, vestidos para todos os gostos, pijamas, camisas de dormir e baby dolls. Tenho também as gavetas da roupa pequena, uma para cada coisa: soutiens de um lado, cuecas do outro, meias de lã e algodão, collants e meias de vidro, écharpes, cachecóis, bikinis. Adoro o meu armário e tudo o que vai lá dentro. Prometo sazonalmente desfazer-me das coisas que já não uso, mas atraiço-me todas as vezes. Não consigo deitar nada fora, reminiscências de antepassados caçadores recolectores decerto, o meu missing link.

As estantes de livros ultrapassam em mais do dobro a largura do armário da roupa, organizados também esses de forma minunciosa. No entanto, não escrevo sobre roupa nem sobre livros. Deve ser por isso que ninguém me chateia nas caixas de comentários. Água, quase tudo, e cloreto de sódio.

domingo, outubro 12, 2008

Lisbon nights

Um homem, quatro mulheres, um palco para karaoke. Ele chega primeiro apenas com duas, com as cervejas trazem-lhes a lista das músicas. Elas passam o tempo todo das bebidas a cantarem estrofes das que pensam poderem cantar, a descobrirem aquelas que não, as que cantariam no carro, no banho, com os pais, com as primas, não no palco, esta talvez, num entusiasmo que parecia infinito. Chegam as outras duas que repetem, durante o mesmo tempo, o ritual de excitação que ele tinha acabado de presenciar com as anteriores. Chega à conclusão que para as deixar felizes seria apenas necessário o catálogo das músicas.

Acabaram por cantar algumas, com mais entusiasmo que afinação. Os aplausos dos incautos habitués começaram por ser de alento mas rapidamente passaram a desesperados por terem de aturar as taradas do 1º andar, que insistiam num bloco central desarmante. Descobrimos que naquele bar o sucesso é feito à força de fados e Tony Carreira, com pérolas até então desconhecidas como o


Porque eu morro
Se passa um dia só e não te vejo
Nem oiço a tua voz quando chamar por ti
Como é que eu vou viver, viver assim
Porque eu morro
Se acordo e tu não estás na minha vida
Sem ter o que me dares, o que vai ser de mim
Por certo vou morrer, morrer sem ti
Sem ti

Ficou a faltar este clássico. Não há de ser por falta de prática que não se repete a façanha.

quinta-feira, outubro 09, 2008

Mona lisa show

De hoje a domingo no CCB.

A dor sentida pela dor causada


Aceitam-se sugestões para aceitar o arrependimento alheio. Para descobrir como é que, verdadeiramente, se aceita a dor sentida pelo mal causado como reparador do dano sofrido. O deus que os homens criaram é infinitamente bom e misericordioso, mas tenho dúvidas que isso seja a imagem e semelhança do que têm dentro de si. Os homens tentaram encontrar uma entidade com as qualidades que lhes faltavam. Mas isso apenas faz com que nos sintamos em falta quando não conseguimos ser divinos como gostaríamos.

quarta-feira, outubro 08, 2008

Nas causas da D. Ester

Fiz 18 anos numa quarta feira de inverno. Nesse dia fiz uma coisa para a qual me preparei durante toda a adolescência até então: fui-me recensear à Junta de Freguesia. Senti-me feliz por poder passar a fazer parte das decisões da cidade e do país. Em meu nome e, pomposamente, em nome de todos os que não o poderam fazer durante tanto tempo. (hoje já não invoco os antepassados, penso mais nos que hão de vir.)

Há uns anos numa conversa em família descobri que a maioria dos miúdos de vinte anos, mesmo os interessados e participativos, não estavam recenseados. Fiquei estupefacta, descobrindo que a maioria dos seus amigos também não o tinham feito. Como é possível que se demitam do seu direito há tão pouco tempo conquistado no nosso país? Quando eu nasci não havia sufrágio universal em Portugal, quando eles nasceram isso já era um direito mais que instalado. Será por isso?

Não me interessa agora discutir as brechas do sistema. O sistema é um problema, já cantam os Enapá há anos. A questão é que se não se estiver recenseado, as probabilidades de que façam parte de algum movimento cívico, independente de partidos e sustentado por convicções, é baixíssimo. Mesmo que vote em branco, nulo, ou no raio que me parta, nada me afasta das urnas no dia de eleições, sejam elas quais forem.

Talvez seja questão de se fazer campanha pelo recenseamento. Como esta


via trapezista

segunda-feira, outubro 06, 2008

Os Ignóbeis

Foram atribuídos os IgNobel deste ano. O que mais me surpreende é que os autores dos artigos premiados se apresentem em Harvard para os receber, passando pela humilhação de terem 60 segundos para o discurso contados por um miúdo de 8 anos. Não consigo entender se é um exercício de demonstração de sentido de humor ou de vaidade pura.

Há uns estudos idiotas, como a capacidade espermicida da coca cola (quem terá sido a mente brilhante a tentar a façanha e a querer demonstrá-la em laboratório? Imagino um puto de 16 anos que inadvertidamente verteu a lata pelos genitais da namorada adentro e em vez de declarar milagrosa a sua não gravidez a terá atribuido à bebida caramelizada e fez disso uma tese de biologia humana) e os picuinhas que se terão dedicado a negá-la (seguramente sem nada melhor para fazer, presumo que com grupo controle a frisumo). Os franceses que descobriram orgulhosos que as pulgas dos cães saltam mais alto que as dos gatos (para quando um estudo sistemático sobre a alimentação de cada um dos grupos animais e o seu efeito no desenvolvimento das patas posteriores dos parasitas?), o italiano que modificou electronicamente o ruído das batatas fritas para soarem mais estaladiças e frescas (a mim parece-me que bastava investir na matéria prima, mas enfim), para além dos suíços que declaram a dignidade inerente às urtigas.


No entanto, o estudo que mais fez sorrir a canzoada foi o dos americanos que estudaram a influência do ciclo ovulatório (e a sua ausência, no caso das tomadoras de anti-concepcionais orais) nas gorgetas das strippers ao longo de dois meses. Evidentemente chegaram à conclusão conhecida por qualquer mulher que o ciclo ou a sua ausência tem um reflexo óbvio na sua sensualidade. Se uma mulher se sente sexy actua dessa maneira, e se faz disso vida ganha mais dinheiro nessa altura.



de G. Miller et al., Evolution and Human Behavior, 28 (2007) 375–381

Dado que em fase anovulatória as raparigas ganham em média 150 dólares, que passa a 400 no período alto de fertilidade, vai haver uma corrida aos indutores de fertilidade que nem ginjas. O que vai dar para espaço para mais estudos ignóbeis decerto.

Continuando o purgatório


Perde-se o tino com a doença, a noção de certo e errado, o bem comum, tratar dos mais fracos. O mal está de fora e não se pode fazer nada contra isso. No caminho para a redenção há que aceitar os limites das próprias forças, as fraquezas de espírito e de corpo, aprender a aceitá-las e a lidar com elas. Para que os outros consigam também aceitá-los e integrá-los.

A estrada para a recuperação não é recta para muitos. A crença num Poder Superior transforma-os em novos cristãos, prontos a gritar aleluia nas alturas mais impróprias. Para alguns foi só colado com cuspo, e com as dificuldades decidem fugir pelo portão sempre aberto, não aguentam as regras, as rotinas, as limitações e as proibições da comunidade, tubo de ensaio da realidade.

Nesta semana houve muitas baixas. Muitas pessoas que desistiram e muitos novos ainda sem visitas, alinhados como num reconhecimento policial - só que ali ao sol, em cadeiras de plástico brancas, com um maços de cigarros em vez do número identificador.

A rapariga muito nova desapareceu, não sabem dela. É bonita, têm medo do que ela andará a fazer ao corpo para ganhar dinheiro para a dose do dia. O rapaz dos ombros largos não veio esta semana para visitar os companheiros. O homem da família numerosa tem os filhos de férias. Apenas o rapaz dos olhos bonitos com faísca recebe de novo o pai, conversam a tarde inteira com sorrisos cúmplices, desta vez sem a mãe e a outra mulher.

Sabes, agora sou guia. Introduzi aquele homem aqui na comunidade. Têm a mesma profissão, tinham ambos tudo para serem homens de sucesso e exemplares. Apenas me resta a esperança que sejam exemplares na recuperação.

Continuo zangada, sinto quanto me custa conversar. Ele pergunta-me pelo namorado, rimo-nos do tempo em que me farejava o telemóvel à procura de rastos da minha vida amorosa. Pergunto-me agora se não seria uma maneira de disfarçar que me tinha ido à carteira tirar as notas que eu pensava ter perdido.

Venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade assim na Terra como no Céu.

domingo, outubro 05, 2008

Disclaimer

A senhora que sorri no meu perfil e mostra o torneio de pernas no cabeçalho deste blog chama-se Esther Williams. Depois de ter sido campeã de natação foi a flutuar para Hollywood, onde se tornou estrela de filmes e protagonista de coreografias aquáticas que ainda hoje são entusiasmantes. Uma autêntica sereia. Fez 87 anos em Agosto, não consta que continue a nadar nem que escreva em blogs. Mas nunca se sabe. O mundo é um pañuelo.

sábado, outubro 04, 2008

Trabalho

O homem salta com páraquedas de aviões, escala rochas em ângulos de 45º com a terra, faz expedições em todas as cadeias montanhosas europeias e algumas africanas, escreve a tese de doutoramento em três meses e o pós doc numa semana.

Mas não come frango porque dá muito trabalho.

sexta-feira, outubro 03, 2008

Bonsai

Nos filmes e anúncios aparecem de vez em quando mulheres de cabelo preso, em carrapitos ou enfiados em capacetes, que ao soltá-lo ficam com um penteado invejável e um irrepreensível ar sedutor e selvagem.

Sempre que tentei repetir o número fiquei com ar de bonsai podado por um zarolho.

quinta-feira, outubro 02, 2008

O que é que faz de mim eu?

Há duas horas acordada, continuo com uma sensação difusa no corpo e na alma como se ainda estivesse a recolher pedaços de humanidade da fronha onde dormi.